29/05/2017

[DIÁRIO]

Ontem eu chorei






















   Ontem eu resolvi assistir o documentário "z-boys e os reis de Dogtown" para passar o tempo de um domingo chato, onde eu estava cansada e recém-chegada de uma viagem de trabalho. Peguei meu prato de comida na hora do almoço e parei em frente ao computador, vendo mais uma vez a história desse "grupo" que revolucionou o que chamamos de skate. Estava tudo  normal até o momento que meu coração foi se enchendo de algo que eu não sei explicar, não sei mesmo. E assim, de repente, comecei a chorar. Chorei muito de ter que enxugar as lágrimas com as minhas mãos e transformar meu rosto num aguaceiro maior ainda. Só de pensar no momento, sinto vontade de chorar novamente. 
   Mas então eu resolvi me perguntar o motivo do choro: "Cara, por qual motivo você está assim? O que houve?". E comecei a juntar tudo o que eu sentia ali naquele momento  para elaborar uma resposta. A única coisa que eu conseguia responder a mim mesma naquela hora era que eu amava muito skate, e que eu não saberia quem era eu sem ele. Parece louco, não é? 
   Minha memória me levou até a infância, onde eu costumava passar as férias numa praia chamada Cordeirinho (Maricá). Foi fácil lembrar os dias no quiosque, as folhas de coqueiro, e a galera que era local. E o som? Era Dire Straits, Men at Work, Inne Circle, Bob Marley, e tudo se transformou em trilha sonora para ver gente que surfava ou andava de motocross ali por perto. Tinha até uma turma "da pesada" que muito me lembrava os z-boys e os personagens do filme Caçadores de Emoção. Eu via e sentia tudo aquilo com os olhos brilhando, curtindo cada momento. Geralmente eu carregava um caderninho, livro ou bonecas para passar o tempo na praia, ao mesmo tempo que me divertia com todas aquelas pessoas que eram dali. Era um local onde "Fora Haole" era escrito em muros, assim como anos depois achei um "Fora Cabral" naqueles mesmos muros. 
   A segunda parte da minha memória aborda meu começo no skate e como tudo era tão puro e despojado. A galera se reunia numa pista de skate daquelas estilo anos 90 quadradonas numa praça que era o pico alternativo do bairro. As primeiras sessions longe de casa aconteciam na casa de um rapaz que tinha minirrampa, e geralmente todos os domingos eram regados de skate, música e cerveja. Quando chegávamos em casa já era noite, e o sentimento era maravilhoso. 
   A terceira memória aborda tudo que já vivi, até quando passei um período sem andar de skate. E essa última memória é que talvez tenha me feito chorar, principalmente ao ver e ouvir Jay Adams. Explicarei agora....
   Com o skate eu aprendi a conhecer os lugares e as pessoas. Consegui expor minha relação com ele também quando passei a escrever para a "antiga" Pense Skate. Estreitei relações entre meninas a partir da criação do Vaka Loka. Lia as revistas de skate e aprendia sobre tudo: manobras, fotografias, vídeos, publicidade, cultura, arte, música. Saboreava cada momento. Até que um dia fui praticar um esporte e o skate foi ficando de lado. E foi ficando, ficando, e ficou. Eu tinha parado de andar. Eu não andava mais de skate. Eu dificilmente falava de skate. Mas sabe o que eu descobri? Eu nunca tinha deixado de ser skatista. Porque existe a diferença entre andar de skate e ser skatista. E skatista eu nunca deixei de ser. Comprovei isso ao lembrar que toda vez que eu "pulava" no esporte, eu pulava como se tivesse um obstáculo na frente. Eu me vestia como se estivesse indo para uma session, mesmo que nos pés estivesse uma chuteira. Eu ainda tinha o estilo das ruas. No fone de ouvido as músicas eram de vídeos de skate. Os olhos percorriam as ruas por onde eu passava ainda como se eu procurasse obstáculos para mandar uma trick ou fotografar. Quando pensava em vídeo, já pensava nos vídeos de skate.
   Descobri que até mesmo no meu trabalho, nas minhas pesquisas acadêmicas, eu tento carregar um pouco do que eu aprendi com o skate, seja o lado urbano, a arte, a escrita, a comunicação, o social, o trabalho individual a favor de todos. Tudo que eu faço é com alma de skatista, não importa onde eu esteja.
   Então eu chorei....chorei muito. Chorei porque eu descobri que a minha vida existe porque eu tenho o skate. O que eu sou, o que eu tenho, o que eu vivo, o que eu faço.... tudo por causa do skate. E sou skatista antes mesmo de andar de skate. Sou skatista desde quando eu estava na praia e curtia aquela vibe de liberdade, essa mesma liberdade que o skate me ofereceu anos depois ao mandar minhas primeiras manobras. 
Então, eu vou chorar sim. E muito. Vou chorar de alegria, de emoção pura. Eu sou a essência do skate desde que nasci. E se um dia essa essência morrer, provavelmente eu morro junto. 

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